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Crítica

Melhores Filmes de 2011

Embora fique sim a sensação de que não foi um ano dos melhores para o cinema no mundo, houve evidentemente grandes filmes. Catorze mereceram menção nessa humilde lista.

1) A Pele que Habito (La Piel que Habito)
De Pedro Almodóvar, Espanha

O que faz com o melodrama, virando-o de cabeça para baixo para renová-lo, mantendo sua potência narrativa, Almodóvar agora faz com o thriller de suspense, num diálogo sensacional com o gênero.

2) Era uma Vez na Anatólia (Bir Zamanlar Anadolu’da)
De Nuri Bilge Ceylan, Turquia/Bósnia-Hezergovina

Acompanhando um grupo formado por policiais, por um promotor e um médico legista, somos levados à estepe no interior da Turquia, em busca de um cadáver. É daqueles filmes que nos ganham pouco a pouco até se transformarem numa coisa imensa, apesar de muito pouco acontecer em termos narrativos. A força das interpretações e a mise-en-scene obsessiva e detalhista de cada plano compõem lentamente e com maestria uma intensa carga emocional e um profundo pano de fundo social, político e cultural.

3) Cópia Fiel (Copie Conforme)
De Abbas Kiarostami, Irã/França/Itália/Bégica

O que é preciso dizer sobre Kiarostami? Seu filme é o oposto radical daquilo a que assistimos cotidianamente nos blockbusters de Hollywood, uma obra de arte construída em cima de e para a participação ativa do espectador. O filme não revela seus mecanismos, mas nos convida quase a nos colocarmos no lugar do cineasta para darmos um sentido àquilo que se passa e ao mesmo tempo refletirmos sobre o lugar do genuíno e da imitação nas relações humanas.

4) Inverno da Alma (Winter’s Bone)
De Debra Grenik, EUA

Interpretações impressionantes, num drama situado no interior miserável do Missouri, em que uma adolescente tenta cuidar dos irmãos mais novos e ao mesmo tempo localizar o pai, um presidiário em liberdade condicional foragido, para evitar que percam sua casa.
Grenik cria um clima sinistro e sufocante, numa narrativa impecável que logra, além de tudo, expor a terrível realidade de uma problemática zona rural americana. Um filme injustamente pouco comentado no Brasil, apesar de ter sido o grande ganhador de Sundance em 2009.

5) Cisne Negro (Black Swan)
De Darren Aronofsky, EUA

Boa parte da crítica e da intelecutalidade desdenhou injustamente do filme. Ele aborda de maneira sensível e complexa o tema da psicose e sua relação com a expressão artística. Não me parece justa a acusação de maniqueísmo ou obviedade no tratamento da relação entre “lado negro” e “lado claro”.

6) Las Acacias
De Pablo Giorgelli, Argentina

Ah, o cinema argentino! E aqui numa pegada absolutamente diferente de um (ótimo) melodrama rasgado como “O Segredo de seus Olhos”, mas guardando algo em comum com o melhor da produção de ficção de nossos vizinhos, que é seu humanismo sutil, onde narrativas ao redor de personagens simples e “anônimos” ajudam a contar, sem sociologismos, a história e a cultura de um país. Nesse longa de estreia, Giorgelli relata a história de um caminhoneiro argentino que dá carona a uma paraguaia e da relação que, lentamente, surge entre eles. Quase nada acontece, mas não é difícil que você acabe em lágrimas.

7) Late Bloomers
De Julie Gravas, França

Julie Gravas consegue tratar com enorme sensibilidade e de forma hilária em muitos momentos um tema perigosíssimo – a velhice – por seu risco melodramático e de chafurdar no politicamente correto. Um filme surpreendente com sensacionais interpretações de William Hurt e Isabela Rosselini.

8) Melancolia (Melancholia)
De Lars Von Trier, Dinamarca/Suécia/França/Alemanha

Estranho e incômodo como todo Lars Von Trier, esse me parece não obstante aquele onde esse cineasta melhor consegue trabalhar o tempo, de forma a que o fluxo da trama nos contamine com a angústia da situação vivida pelos personagens.

9) Huellas y memória de Jorge Preloran
De Fermin Rivera, documentário, Argentina

Jorge Prelorán, falecido em 2009, é talvez o maior documentarista argentino e uma figura humana ímpar. Diretor de dezenas de documentários, incluindo uma indicação ao Oscar de Melhor Documentário, Prelorán criou um método próprio que depois denominaria de “etno-documental”, pelo qual registrou e expôs grandes figuras populares do interior da Argentina. Com muito êxito, Fermin Rivera rebate o método sobre seu autor, fazendo um filme nos mesmos moldes sobre o próprio Prelorán, revelando-o como um grande artista e personalidade, um homem que não fez cinema a partir de uma ideologia, mas que, de sua necessidade de falar com imagens e a partir de sua peleja cotidiana com o filme, criou uma ética e um método de fazer filmes. Sensacional. Uma inesperada surpresa cinematográfica desse ano.

10) Céu sobre os Ombros
De Sérgio Borges, Brasil

Minha sensação sobre esse filme é a de que, quanto mais o tempo passa, mais gosto. Uma delicada incursão no território do meio entre documentário e ficção, onde três personagens reais se representam e fazem, nas palavras do diretor, uma “auto-ficção” de suas vidas. A despeito das tênues linhas narrativas, o filme consegue promover intensa empatia com os personagens e, ao mesmo tempo, nos fazer pensar sobre essa significativa fronteira entre realidade e ficção, entre documentário e imaginação.

11) A Árvore da Vida (The Tree of Life)
De Terrence Malick, EUA

Tudo se disse sobre esse filme, pra bem e pra mal. Acho que Malick teve sucesso num terreno perigoso, pela ambição do filme. Para mim, é sobretudo um filme sobre fé, não a fé histérica dos evangélicos cada vez mais comum em dia, mas a precária fé de quem não teve nenhum tipo de revelação ou iluminação, e ainda assim conclui que não há solução fora de Deus.

12) O desaparecimento do Gato (El Gato Desaparece)
De Carlos Sorin, Argentina

Um Sorín renovado, absolutamente distinto de todos os seus filmes anteriores, todos com uma abordagem humanista focada em personagens simples diante de seus pequenos dilemas. “O Desaparecimento…” é um filme profundamente irônico, de um humor muitas vezes negro, num estilo de cinema que remete muito a Hitchcock.

13) Vou Rifar meu Coração
De Ana Rieper, documentário, Brasil

Para mim, não surpreende que os melhores filmes brasileiros de 2011 sejam um documentário e um quase-doc/quase ficção (O Céu Sobre o Ombros, de Sérgio Borges). Somos, a meu ver, muito melhores documentaristas que ficcionistas. Nesse sensacional documentário, Ana Rieper consegue relacionar, de maneira sensível e profunda, a música brega à sentimentalidade popular brasileira, extraindo depoimentos de impacto de personagens comuns do povo e de grandes ídolos musicais, como Odair José, Lindomar Castlho, Agnaldo Timóteo e Vando, entre outros.

14) Catfish
De Henry Joost e Ariel Schulman, documentário, EUA

Um estranho documentário com ares de thriller sobre a relação iniciada através do Facebook por Nev, irmão de um dos diretores, com uma mulher. Quando eles decidem visitá-la em sua casa a meio país de distância, nada é o que parecia ser.
O filme consegue usar a estética de reality-show e espetáculo “ao vivo” em seu favor e em prol dos personagens, tratando com respeito figuras tentadoramente fáceis de se retratarem como bizarras (no mal sentido), mas sem deixar de fazer com que nos surpreendam.

Sobre Pedro Novaes

Diretor e Produtor de Cinema e Vídeo. Sócio da Sertão Filmes, produtora com base em Goiânia, Brasil.

Discussão

2 comentários sobre “Melhores Filmes de 2011

  1. Oi! Dos 14, assisti 7, tambem são filmes que gostei sem qualquer restrição! Temos o mesmo gosto cinematográfico, faz sentido que Naji tenha fotografado Nostalgia, ele consegue captar esse tipo de sentimento de roteiro na imagem. So vi fotogramas e o teaser, mas esta muito belo. Tão bonito achei que pensei em usar um fotograma do filme, a paisagem que a luz esta indo embora, para desejar um Ano Bom aos amigos. Pediria, claro 🙂 aos dois. Porem, ja escolhi uma foto de um coelho mesmo…
    Fiiquei com vontade de assistir aos docs, voce viu na Mostra? So gosto de assistir filmes no cinema, tou tentando mudar isso, tentando comecar a ver em tv…Bom Ano Cinematografico para voce!
    Katinha Coelho

    Publicado por Katia Coelho | 26/12/2011, 10:48 AM
  2. Como assim filmes deste ano, sendo que grande parte é de 2010?

    Publicado por William Bruno | 30/12/2011, 10:08 AM

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